A partir de uma inquietação pessoal, andei pensando sobre o lugar dos passistas veteranos nas escolas de samba. Atualmente observa-se um boom no meio deste segmento, onde se percebe uma onda de destaque e valorização muito bem vinda. Os debates e propostas estão surgindo num movimento dentro do próprio segmento, o que o reveste de uma maior credibilidade e legitimidade.
Termos como “malandros” “bambas”, “cabrochas”, referências do passado (anos 20/30), são agora, comumente utilizados, embora antes tivessem um caráter personalíssimo, ou seja, era uma característica do indivíduo sambista, ou seja, um sujeito que dominasse a arte do samba, poderia sem constrangimentos, desfilar em várias escolas, porque seu prazer estava na arte de sambar, muito embora isso pouco acontecesse em razão da distância entre as primeiras escolas e a predominância do espírito de grupo. Mais tarde, com a organização das escolas de samba (1950), o elemento agora chamado “passista” passou a agrupar-se e identificar-se com uma agremiação específica.
O passista sempre esteve, de alguma forma, “assombrado” por alguma ameaça. Ora é o temor de que as mudanças no carnaval sejam tamanhas que os elimine de vez dos desfiles; ora um “corte” perpetrado por algum dirigente num determinado ano, em fim, o passista vive no dilema entre o SER e o ESTAR.
Alguém é passista hoje e deixa de sê-lo amanhã? No trabalho de dissertação de mestrado apresentado na Universidade Federal do Rio de Janeiro por Simone Sayuri Takahashi Toji (SAMBA NO PÉ E NA VIDA: CARNAVAL E GINGA DE PASSISTAS DA ESCOLA DE SAMBA ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA) ela afirma: “[...] A carreira de passista depende totalmente da sua performance, e esta por sua vez é dependente do vigor físico do indivíduo. Por isso, é uma carreira que tende a atingir seu maior desenvolvimento durante a juventude e a maturidade física, declinando conforme o intenso envelhecimento da pessoa [...] Assim como os esportistas, a carreira do passista se escora grandemente nas suas habilidades e aparência físicas e, com o avançar da idade, vai se tornando cada vez menos recompensadora. Conforme conversamos com diversos deles, a carreira pode terminar por volta dos 40 e 50 anos, “até quando as pernas aguentarem” ou “o corpo segurar o biquíni”. A partir daí, os passistas, tanto femininos quanto masculinos, passam a ocupar posições que lhes exige menos fôlego do corpo”.
Alguns, após essa mudança de status, ou seja, quando deixam a ala de passistas, procuram buscar outros espaços dentro da escola de samba, seja numa ala de comunidade, seja na diretoria, ou até mesmo se afastam por completo, guardando na memória histórias de momentos mais ou menos célebres de sua trajetória.
Acreditamos, entretanto, que as coisas podem e devem ser diferentes. O que determina e qualifica um passista é, antes de mais nada, sua aptidão e domínio sobre a dança do samba. Nesse sentido, crianças, jovens ou idosos podem sambar e consequentemente serem passistas, independentemente de suas idades. Temos alguns exemplos tais como “Vitamina” (Salgueiro - 80), Celso (Mangueira – 57), Jofre (Mangueira – 60), Aldione (Vila Isabel- 57), Valci (Portela – 44), Nilce Fran (Portela – 48), Indio (Mangueira -50) . Vale destacar, que pelo menos dois destes – Valci Pelé e Nilce Fran foram premiados com o Estandarte de Ouro, premio concedido pelo Jornal O Globo, como os melhores passistas do Carnaval 2012.
O problema que persiste é que apenas alguns poucos passistas conseguem continuar desenvolvendo seu ofício com prestígio e dignidade, principalmente as mulheres, bastante prejudicadas pelos figurinos de fantasias e uniformes de ala cada vez mais infanto juvenis.
Ano passado havia na mangueira uma ala para casais e que caiu como uma luva nas mãos de “ex” passistas. O figurino reunia a leveza necessária e a estética adequada para um casal de passistas adultos, mas o figurino não objetivava vestir passistas, foi apenas uma alegre coincidência que favoreceu a muitos “ex-passistas”.
Acreditamos que cada coordenador de ala deveria buscar junto a direção de carnaval, reintegrar antigos passistas que possam e queiram ainda desfilar sambando, conscientizando diretores e carnavalescos da necessidade de se elaborar figurinos adequados e com isso valorizar aqueles que tanta dedicação prestaram à escola e ao samba. São os mais velhos que guardam o passado da escola.
Em 2012 inauguraram-se as comemorações do Dia do Passista com palestras e shows no SESC Madureira. Em 2013, organizou-se um grande e belíssimo desfile na Marques de Sapucaí que reuniu alas de passistas de diferentes escolas e grupos. Muitas homenagens mais que merecidas, mas a maior premiação que um passista pode ganhar é ter seu espaço assegurado no desfile de sua escola. E se as escolas desfilam atualmente com uma média de 4.000 componentes, certamente haverá lugar para 20 ou 30 passistas que o tempo não fez parar.
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